sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

Problema encravado nas cidades

Risco constante de acidentes faz com que moradores reivindiquem mudança de traçado de linha férrea
 
Ricardo Chicarelli

A população cruza a pé, de bicicleta ou então com motos, sem nenhuma segurança
 
Gina Mardones

Em Arapongas, a linha férrea divide o Conjunto Flamingos e a Vila Araponguinhas do centroRicardo Chicarelli
 
Londrina - Símbolos do desenvolvimento econômico da região nos anos áureos do café, os trilhos de trem perderam importância nas últimas décadas e se tornaram problema encravados dentro das cidades. Em todo país são 912 municípios nesta situação. Na região de Londrina, o problema é mais grave em Cambé, Rolândia e Arapongas e Apucarana. Com registros constantes de acidentes, moradores reivindicam a mudança de traçado.

Em Arapongas, por exemplo, a linha férrea divide o Conjunto Flamingos e a Vila Araponguinhas do centro da cidade. Vários operários têm que atravessar os cruzamentos todos os dias no trajeto entre a casa e o serviço. As poucas passarelas existentes são pouco usadas, retrato da imprudência dos pedestres. O frentista de um posto de combustível, José Ávila de Araújo, trabalha de frente para um dos cruzamentos mais perigosos da cidade. Ele conta já ter flagrado vários acidentes. "O desvio da linha do trem é promessa de campanha de quatro entre cinco candidatos a prefeito. Há muitos anos escuto essa conversa, mas nunca sai do papel", condenou.

O problema relatado por Araújo, porém, não é exclusividade da cidade. Segundo dados do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), foram investidos R$ 582 milhões em ferrovias desde 2007 por meio do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Deste total, R$ 412 milhões foram destinados para desviar o traçado das linhas para fora do perímetro urbano, porém apenas duas ficaram prontas: em Campo Grande, Mato Grosso do Sul, e Campo Belo, Minas Gerais. Outras três seguem em andamento, nenhuma na região.

Apucarana
A falta de manutenção dos dormentes e trilhos e o risco de acidente levaram várias cidades a pedir a retirada dos trilhos de áreas urbanas. Em Apucarana (Norte-Centro), o prefeito Beto Preto (PT) chegou a reivindicar a transposição da linha férrea no Ministério dos Transportes. O custo da obra, avaliado em R$ 270 milhões, é o maior entrave. Como solução, o prefeito indica a construção de dois viadutos e uma trincheira, avaliados em cerca de R$ 4,5 milhões.

A possibilidade de modernização das linhas com a passagem da Ferrovia Norte-Sul fez com que o pedido do contorno fosse adiado. "Se for para trazer benefícios para o município e região, é cabível que o trem continue passando dentro da cidade. Mas atualmente, só temos ônus com linhas antigas", expôs. "Nossas ferrovias projetadas há um século estão degradadas. Precisamos modernizar o transporte ferroviário e isso inclui a segurança aos moradores", completou.

Acidentes
Cambé possui o histórico mais triste de acidentes. O mais recente aconteceu há 20 dias. Um homem morreu atropelado pelo trem próximo da BR-369, quase no limite com Londrina. Em novembro do ano passado, duas pessoas morreram atropeladas na mesma semana. Em abril de 2010, duas crianças morreram atropeladas. Uma trincheira foi construída próxima à estação na época.

No outro lado da estação, no entanto, a única advertência no cruzamento é o trinômio imperativo: "Pare, olhe, escute". Quando o trem está parado, a passagem fica bloqueada. "Tem vezes que preciso pegar meu filho na escola e chego atrasada porque tenho que esperar o trem passar", reclamou a auxiliar de serviços gerais, Maria Juliana da Silva, 29 anos. Com a passagem livre, a população cruza a pé, de bicicleta ou então com motos, sem nenhuma segurança.

Se para quem cruza a ferrovia duas vezes por dia a sensação de insegurança já é grande, a situação é pior para quem mora ao lado do problema. O aposentado João Maria Figueiredo dos Santos, de 56 anos, mudou-se há quatro meses para a Rua Floresta, na Vila Oliveira, em Rolândia. Ele conta que a casa treme todas as 10 vezes que o trem passa no dia. "A noite é pior, todos acordam assustados. Nós só conseguimos dormir depois que todos os vagões se distanciam, o que leva uns 10 minutos", contou. "Deixar as crianças brincar na rua nem pensar".

Trem Pé Vermelho
O Trem Pé Vermelho, projeto que pretende ligar Londrina a Maringá com o transporte de passageiros é um desejo comum entre os municípios da região. O prefeito de Rolândia, Johnny Lemann (PTB), acredita que um contorno poderia prejudicar os moradores futuramente. "Temos a esperança de que um trem de passageiros retorne, pois é o ideal para o transporte de massas. Então não podemos levar a linha para longe da população".

Ele citou o caso de Londrina, que nos anos 1970 teve a linha férrea desviada do traçado original, na Avenida Leste-Oeste, para os fundos do Estádio do Café (zona norte). "Hoje a cidade já chegou lá. Melhor se fizessem como em Maringá, com o rebaixamento da linha férrea", comparou, citando o investimento de aproximadamente R$ 120 milhões do governo federal nas obras em 7,3 mil metros da zona urbana de Maringá, concluídas no ano passado.

A reportagem entrou em contato com a assessoria da América Latina Logística (ALL), responsável pelos trens que cruzam o Estado, mas não obteve retorno até o fechamento da edição.
Celso Felizardo
Reportagem Local

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